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Precatórios no divorcio: o que acontece com o crédito em caso de separação

Quem enfrenta um divorcio e descobre (ou lembra) que há um precatório a receber costuma ter a mesma dúvida: esse crédito entra na partilha? A resposta depende de três elementos centrais: o regime de bens do casal, a origem do crédito e o momento em que o direito nasceu

A seguir, organizamos um guia prático e completo — com base na Constituição, no Código Civil e na orientação recente do STJ — para você entender quando há meação, como provar e como operacionalizar a partilha do precatório no divorcio.

1) Antes de tudo: o que é precatório e por que isso importa na partilha

“Precatório” é a forma constitucional de a Fazenda Pública (União, Estados, DF e Municípios) pagar condenações judiciais transitadas em julgado. Em regra, há uma fila cronológica de pagamento e um regime jurídico próprio (ordem de apresentação, vedação de fracionamento indevido etc.). Essa natureza pública e regrada do pagamento explica por que a partilha deve ser bem documentada e comunicada ao juízo do precatório: sem essa formalização, o valor pode sair integralmente em nome de um só ex-cônjuge. 

2) O papel do regime de bens

O regime de bens define quando um direito creditório comunica entre cônjuges. Na comunhão parcial (regime legal supletivo), em princípio comunicam-se os bens e direitos adquiridos onerosamente na constância do casamento, com as exceções dos arts. 1.659 a 1.661 do Código Civil (doações, heranças, sub-rogação etc.). Já na comunhão universal, a comunicação é ampla (salvas as exceções legais). Na separação convencional/obrigatória, predomina a incomunicabilidade, salvo hipóteses excepcionais. Há ainda a participação final nos aquestos, que apura os aquestos ao término. 

3) O momento-chave: quando o direito ao crédito “nasce”

Para fins de meação, o que importa é quando o direito se constituiu, não quando o dinheiro foi pago. Se o fato gerador do crédito ocorreu durante o casamento, a tendência — especialmente na comunhão parcial — é reconhecer a comunicabilidade, ainda que o pagamento (ou o reconhecimento judicial) só ocorra depois do divorcio. Em 14/03/2025, o STJ reafirmou essa lógica: a ex-esposa tem direito à meação de crédito originado no casamento, ainda que só reconhecido após a separação

Exemplos práticos

  • Verbas salariais atrasadas (natureza alimentar) reconhecidas em ação contra o ente público, cujo fato gerador ocorreu no período conjugal.
  • Diferenças reconhecidas em contrato/execução que tramitou durante o casamento, mesmo se a sentença saiu depois do divorcio.

4) A natureza do crédito pode influenciar

Precatórios alimentares (ex.: salários, proventos, benefícios previdenciários) têm preferência na fila e, muitas vezes, dialogam de modo mais direto com a realidade econômica do casal. Além disso, a jurisprudência reconhece, em várias hipóteses, a comunicabilidade de créditos formados na constância do casamento. Importante: preferências na ordem de pagamento não decidem, sozinhas, a partilha — mas ajudam a desenhar a estratégia (reserva de meação, comunicação ao juízo, etc.). 

5) Regra prática por regime (checklist rápido)

Comunhão parcial

  • Presunção de esforço comum: direitos creditórios nascidos no casamento tendem a comunicar — salvo exceções legais (doações/heranças, bens sub-rogados etc.). O STJ tem reafirmado a amplitude da partilha em comunhão parcial, inclusive quando um bem foi adquirido com recursos de apenas um cônjuge.

Comunhão universal

  • Regra de comunicação ampla, observadas as exceções do Código Civil. Em geral, o crédito entra na massa partilhável se o direito nasceu na constância.

Separação (convencional/obrigatória)

  • Em regra, não há comunicação; pode haver litígios específicos quando se alega fraude, confusão patrimonial ou enriquecimento sem causa, mas a prova é mais exigente.

Participação final nos aquestos

  • O crédito compõe os aquestos se houver aquisição onerosa durante o casamento; a apuração se dá ao final, como num “balanço” do que efetivamente se adquiriu.

6) divorcio sem travar a partilha: é possível

O divorcio não precisa esperar a partilha. A orientação sumulada do STJ é clara: o divorcio direto pode ser concedido sem prévia partilha — deixando-se a divisão de bens e créditos (como o precatório) para depois, por acordo ou ação própria. Isso é especialmente útil quando o crédito ainda está sendo discutido ou calculado.

7) Provas e documentos: como vincular o crédito ao período conjugal

Para sustentar a meação, junte:

  • Sentença/Acórdão e trânsito em julgado, se houver;
  • Certidão do requisitório (precatório/RPV) e demonstrativos de cálculo;
  • Peças essenciais do processo de origem que demonstrem o fato gerador no período do casamento;
  • Documentos funcionais (se alimentar): contracheques, atos administrativos, laudos de diferenças;
  • Certidão de casamento, pacto antenupcial (se houver) e prova do regime de bens.

Esses elementos costuram a narrativa técnico-jurídica: o direito nasceu no casamento e, por isso, integra a esfera partilhável, mesmo que o pagamento ocorra após o divorcio. 

8) Como operacionalizar a partilha do precatório (na prática)

Há três caminhos usuais — que podem ser combinados:

  1. Partilha direta do direito creditório
    O casal reconhece a copropriedade do crédito. Na sequência, requer-se ao juízo do precatório a averbação/reserva do quinhão do ex-cônjuge, para que, quando sair o pagamento, cada um receba sua parte diretamente. A comunicação formal evita surpresas na boca do caixa.
  2. Cessão parcial do crédito ao ex-cônjuge
    Em vez de copropriedade, um cede ao outro um percentual do precatório. A cessão de precatórios é admitida pela Constituição, pedindo-se comunicação ao juízo para que o requisitório passe a refletir o novo cessionário (ou co-cessionário). Em muitas praças, exige-se escritura pública por normativos e práticas administrativas — medida prudencial para segurança jurídica.
  3. Compensação
    Um fica com 100% do precatório; o outro, com bem/valor equivalente (com avaliação e compensação). Útil quando há urgência de liquidez para um lado e paciência para esperar a fila do outro.

Atenção: qualquer que seja a via, o passo decisivo é oficiar o tribunal/juízo do precatório para reservar ou anotar a divisão; caso contrário, o pagamento tende a seguir ao titular cadastrado — o que pode gerar novo litígio. 

9) Tributação e custos: o que observar

O tratamento tributário varia conforme a natureza do crédito (alimentar ou comum) e o modal escolhido (partilha do direito x cessão com ágio/deságio). Pode haver impactos em IR (rendimentos/ganho de capital) e emolumentos (escritura/registro) quando houver cessão. Por isso, acordos de divorcio que envolvem precatórios devem trazer cláusulas tributárias claras e, se possível, a consulta prévia ao contador/tributarista.

10) Fraude à meação: como prevenir e reagir

Sinais de alerta incluem ocultação do processo, cessão “relâmpago” do crédito após a separação de fato, antecipações suspeitas, confusão com pessoa jurídica e retirada de documentos do outro cônjuge. Remédios processuais: tutela de urgência para bloquear/averbar a meação, ofícios ao juízo do precatório e medidas mais enérgicas nos casos de blindagem patrimonial indevida. A chave é agir cedo, durante ou logo após o divorcio, para evitar que o pagamento saia sem a reserva do quinhão. 

11) Perguntas frequentes (FAQ)

“Dá para partilhar se o processo ainda está em discussão?”
Sim. O que se partilha é o direito, ainda que litigioso ou ilíquido, amarrando-se cláusulas condicionais (se/quanto for pago). É até mais seguro resolver a arquitetura da partilha logo no divorcio e averbar no processo do precatório. 

“E se o crédito for reconhecido depois do divorcio?”
Se o fato gerador ocorreu no casamento, a meação pode ser reconhecida, mesmo que a sentença ou o pagamento saiam depois. O STJ reiterou isso em 14/03/2025. 

“O precatório alimentar muda algo?”
Muda a preferência na fila e, em muitos casos, facilita a demonstração de que o direito nasceu no período conjugal (por exemplo, diferenças salariais). Mas a comunicabilidade segue a lógica do regime de bens e do momento de aquisição. 

12) Roteiro de peticionamento (passo a passo)

  1. Qualifique o regime de bens e o período do casamento;
  2. Descreva a origem do crédito (processo de origem, tese, período a que se refere);
  3. Prove o momento de aquisição do direito (fato gerador) com documentos;
  4. Calcule a meação (percentual/valor estimado) e a forma de divisão (copropriedade, cessão ou compensação);
  5. Peça:
    • a homologação do acordo/partilha no divorcio (se ainda não homologado),
    • a expedição de ofício ao tribunal do precatório para averbação da meação ou da cessão,
    • e, se necessário, tutela de urgência para impedir pagamento sem reserva.

13) Casos especiais

  • União estável: aplica-se, em regra, a lógica da comunhão parcial (art. 1.725 do CC). Portanto, o raciocínio sobre fato gerador e aquisição do direito também vale aqui.
  • Acordos extrajudiciais de divorcio: viabilizam rapidez, sem travar a partilha. Mas é essencial já indicar no instrumento a existência do crédito e a providência de oficiar o tribunal do precatório.

14) Subtítulo obrigatório com a palavra-chave: Estratégias no divorcio para proteger (e receber) a meação do precatório

No divorcio, a melhor estratégia é diagnosticar cedo a existência de ações contra a Fazenda, classificar a natureza do crédito (alimentar/comum), mapear o momento de nascimento do direito e eleger a via de operacionalização (copropriedade, cessão ou compensação). Em seguida, formalize a decisão no acordo/sentença do divorcio e comunique o juízo do precatório para registrar a reserva — passo que, na prática, evita frustrações quando o pagamento sair. 

Conclusão

Precatórios e divorcio exigem uma amarração técnica entre direito de família, obrigações e processo. Se o direito nasceu no casamento, a regra — sobretudo em comunhão parcial — é a comunicabilidade, mesmo se a Fazenda pagar depois do divorcio. O que diferencia um caso bem-sucedido de outro frustrado é a prova do fato gerador, a escolha da via de partilha e, principalmente, a comunicação efetiva ao juízo do precatório para reservar o quinhão. Com esse roteiro, é possível fechar o divorcio sem protelar a vida, preservando o patrimônio de cada parte para quando o requisitório for, enfim, pago.

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